Análise de Conjuntura da CNBB!

12/05/2014 19:47
Artigos - Opinião
12.05.2014
 
Análise de Conjuntura
 
 
 
Adital

Texto de análise de conjuntura geral apresentado na 52ª Assembleia Geral dos Bispos do Brasil, que acontece no Centro de Eventos padre Vítor Coelho, em Aparecida (SP) de 30 de abril a 9 de maio de 2014.

Introdução

A realidade Brasileira se mostra complexa, plural e em movimento constante. Nela, diferentes aspectos conjunturais se evidenciam com nuanças próprias conforme as dinâmicas sociais e provocam movimentos nos diferentes atores sociais dentro de algumas características estruturais mais ou menos permanentes. Num país com dimensões continentais como o Brasil, com suas desigualdades sociais e regionais, isso faz com que mesmo questões conjunturais nacionais possam ter diferentes níveis de percepção da população.

Nos últimos 20 anos, o Brasil foi capaz de alguns avanços: superar a ditadura civil-militar, vencer a hiperinflação, distribuir moderadamente a renda e alcançou uma inédita presença no cenário mundial. Entretanto, carece de reformas estruturantes, indo além de programas sociais que, embora exitosos, geram dúvidas no longo prazo e pouco alteraram as seculares discrepâncias sociais.

Em 30 de abril de 1963, bispos brasileiros apontaram as linhas inadiáveis de transformações sociais, econômicas e políticas de que o Brasil precisava. 50 anos depois parece que tais aspectos continuam atuais e com desafios ainda maiores. A Comissão Central da CNBB analisava que "nossa ordem é, ainda, viciada pela pesada carga da tradição capitalista, que dominou o ocidente nos séculos passados. É uma ordem de coisas na qual o poder econômico, o dinheiro, ainda detém a última instância das decisões econômicas, políticas e sociais. Exigem-se profundas e sérias transformações”. E enumerava no documento aspectos sobre a questão rural, a reforma da empresa, a reforma tributária, a reforma administrativa, a reforma eleitoral e o problema educacional.

Nesta análise priorizamos quatro grandes questões ou temas nacionais, dois mais gerais e dois mais focalizados. Os dois aspectos mais gerais dizem respeito, primeiro lugar, à conjuntura política com comentários sobre o sistema político brasileiro e o quadro da disputa eleitoral em 2014 e, em segundo lugar, à economia nacional destacando sua estreita vinculação com a situação da desigualdade social. Nessa abordagem sobre a economia, apresentamos também uma análise sobre a desinformação promovida pelas coberturas jornalísticas dos grandes meios de comunicação e pela forma de comunicação do Governo Federal.

Os dois outros pontos, que aqui classificamos de mais focalizados, dizem respeito ao tema da violência no Brasil e à situação dos povos indígenas, quilombolas e outras populações tradicionais.

Ao final apresentamos alguns temas que nos parecem importantes em qualquer análise da realidade nacional, mas que esse texto não tinha condição de abordar com a delimitação adequada. Alguns perpassam transversalmente o conjunto da análise, mas todos constituem pautas da sociedade brasileira neste ano de Copa do Mundo e de Eleições quase gerais (presidente, senadores, governadores deputados federais e estaduais).

Conjuntura Política

"A Reforma Política que o país necessita, com urgência, não pode se limitar às regras eleitorais e, dentro delas, o funcionamento dos partidos. Ela precisa atingir o âmago da estrutura do poder e a forma de exercê-lo, tendo como critério básico inspirador, a participação popular.” (CNBB 91, n. 101)

Uma crise da democracia representativa?

Mais do que em outros países é profunda a crise da representação política brasileira. As formas clássicas da Democracia com a representação harmoniosa dos três poderes - Legislativo, Executivo e Judiciário - parecem não ter mais a serventia de outrora na resolução dos novos conflitos gerados pelo acelerado processo de urbanização, das novas relações de trabalho, pelo impacto do chamado "desenvolvimento” no meio ambiente, na preservação e ampliação dos direitos humanos e sociais, na resolução das desafiadoras questões da saúde, da educação e da segurança pública.

Os representantes do povo – "os políticos” - em todos os níveis, gozam de baixíssima credibilidade. Poder Legislativo: seus integrantes - em nível municipal, estadual e federal - vereadores, deputados estaduais e federais, senadores são radicalmente desconsiderados pelo cidadão. As eleições são vistas como mera forma de perpetuar as oligarquias locais. É muito baixo o índice de renovação. O poder econômico que torna as eleições ocasião de despesas vultosas é uma das causas. Elege-se quem tem mais dinheiro investido na campanha, salvo raras e confirmatórias exceções. O eleitor não se sente representado, não valoriza o candidato, não valoriza os partidos políticos (dominados por "caciques”) e não valoriza a Política.

A mídia reforça esta visão antidemocrática contribuindo para que "ser político” se torne sinônimo de "ser desonesto”. As instituições políticas, assim, recebem notas baixíssimas nas pesquisas de confiança popular. Nesta moldura os quadros de liderança democrática se reduzem, mínguam e não se elegem. São bem sucedidos os que representam o capital, os interesses financeiros, de empreiteiras e latifundiários. A classe política não age, assim, em favor dos interesses populares, mas a favor de seus interesses corporativos e dos grupos econômicos.

As Eleições presidenciais 2014: alguma mudança é prevista?

As eleições presidenciais de 2014 foram "antecipadas” em razão de um embrionário movimento nas hostes do governismo em torno do "volta Lula” e o fato de as candidaturas de oposição de Aécio Neves, Eduardo Campos e Randolfe Rodrigues serem pouco conhecidas, exceto em seus estados, forçando-os a se movimentarem em busca de apoios políticos regionais para consolidarem suas candidaturas. As candidaturas esforçam-se por mostrar "musculatura”, capacidade de agregação de apoio político, visto que a expectativa de vitória influencia os chamados "eleitores invisíveis”, ou, dito de outra maneira, os financiadores de campanha. Em 2014, se confirmadas às pesquisas de opinião, provavelmente o pano de fundo das eleições será um misto de mudança e continuidade.

O ambiente binário "mudança-continuidade” faz com que o quadro eleitoral em 2014 seja mais sinuoso e de difícil previsão. Aponta para uma sofisticada operação política em que nenhuma candidatura com chance real de vitória se apresentará como "oposição a tudo isso que está aí”, ou muito menos o governismo defensor de "tudo que aí está”. A candidata governista incidirá para convencer o eleitorado que é capaz de implementar as mudanças desejadas, assim como mitigar certo desconforto com a realização da Copa do mundo, pois segundo o governo, o evento esportivo será positivo na projeção brasileira no mundo e os custos da construção dos estádios seriam muito aquém do propagado. Buscará, por meio de debates e interação nos meios de comunicação, alterar a percepção contraditória detectada em pesquisa de opinião: de um lado a maioria apoia a realização da Copa; do outro, vê os seus custos como elevados e com pouco retorno social.

Não obstante existirem pelo menos três candidaturas situadas no campo oposicionista, cada qual com seus próprios interesses e projetos, todas convergem tacitamente no entendimento de que o palco da disputa poderá se alterar substantivamente no instante que iniciar a copa do mundo, visto as expectativas de grandes mobilizações que poderiam colocar em questão os elevados gastos com as obras em detrimento de investimentos na área social. Apesar de que houve acentuada queda no apoio às manifestações, especialmente depois de cenas de violência.

As pesquisas de opinião têm captado uma difusa sensação de mal estar, que em geral fortalece as candidaturas situadas na oposição. Entretanto, o que se verifica é o crescimento de um perigoso ceticismo em amplos setores do eleitorado disposto em sufragar branco, nulo ou até se abster de votar. Alguns analistas identificam, como fatores desse ceticismo, a ausência entre as candidaturas de uma proposta que empolgue o eleitorado descontente e a recorrente ação midiática - com decisiva "colaboração” dos próprios partidos - de criminalizar a política. As constantes e intermináveis denúncias, nem todas verdadeiras, atingem partidos no governo e na oposição.

No ambiente econômico, provavelmente as eleições se desenvolverão sendo marcada por um crescimento tímido do Produto Interno Bruto (PIB), ligeiramente superior ao verificado em 2013. O desemprego deverá oscilar próximo aos índices atuais e a inflação dificilmente sairá do controle. As projeções "favoráveis” no ambiente econômico, exceto a emergência do extraordinário, caminharão sem sobressaltos durante o processo eleitoral.

As manifestações de junho de 2013 explicitaram os limites e a fadiga do atual modelo calcado na inclusão social e no estímulo ao consumo. Os sinais e as movimentações das forças políticas denotam que podemos estar entrando em um novo ciclo, e que o debate político poderá ser muito mais estratégico e o jogo será muito mais sofisticado que o vivemos até então.

São desafios nesse contexto:

a) Construir uma grande mobilização popular para uma participação crítica no processo eleitoral para que o exercício da política esteja a serviço do bem comum e que o exercício do poder seja vivenciado como serviço ao outro, sobretudo dos que sofrem com as situações de pobreza e desrespeito à sua dignidade;

b) Fortalecer as iniciativas populares que propõem reformas no sistema político brasileiro. Tanto são importantes iniciativas de leis infraconstitucionais, que podem efetuar mudanças com mais rapidez no rumo de fortalecimento da democracia, como propostas mais amplas que apontem as necessárias alterações constitucionais.

c) A intensificação do controle social sobre a gestão pública no executivo, no Judiciário e no Legislativo. Comitês populares de acompanhamento da execução orçamentária, de acompanhamento das ações legislativas, observatórios sociais das políticas públicas, do judiciário podem ser interessantes exemplos de iniciativas, mas não desobrigam mudanças que criem instâncias de maior participação social na gestão pública.

Economia e Sociedade

"Assim como o mandamento «não matar» põe um limite claro para assegurar o valor da vida humana, assim também hoje devemos dizer «não a uma economia da exclusão e da desigualdade social». Esta economia mata.” (EG53)

A economia e a desigualdade social

O conflito maior, nem sempre explicitado, é a desigualdade social estruturante da sociedade brasileira. O paradigma sócio-geográfico é o da casa grande e senzala. Em termos mais modernos, macroeconômicos e sociais, basta mencionar que o Brasil tornou-se a sétima potência econômica do mundo, mas ficou no 83° lugar no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano das Nações Unidas (IDH).

Nos últimos anos, foram feitas tentativas para corrigir as desigualdades: pelo aumento do salário mínimo acima da inflação, por programas sociais como a "Bolsa-Família” e outros, aumentando os chamados gastos sociais. Na última década, cerca de 28 milhões de brasileiros deixaram a extrema miséria e a pobreza e tivemos uma redução nos níveis de desemprego. Assim, hoje se fala de uma classe "C”, nova classe média, tendo acesso ao consumo. Essas políticas sociais não tocaram, no entanto, nas estruturas sociais e culturais; as classes dirigentes, econômicas e financeiras, criticaram as políticas do governo, por serem responsáveis pelo descontrole do tripé que regula a economia: controle da inflação, do câmbio e fiscal, e por desrespeitar a doutrina liberal segundo a qual todo crescimento econômico, favorecido pelo livre mercado, consegue por si mesmo produzir maior equidade social e inclusão social no mundo.

A política econômica continua fortemente ditada pela economia de mercado, baseada nos lucros exagerados do capital financeiro, (juros bancários os maiores do mundo) na predominância do latifúndio (o agro business no modelo monocultivador e de exportação é privilegiado), no desenvolvimentismo predominante sobre o desmatamento, ofensas graves aos recursos hídricos, instaurando-se, assim, uma ordem econômica que perpetua a baixa qualidade de vida e a convivência de uma minoria extremamente rica e uma maioria de pobres. As carências da população se identificam mais com as áreas de Educação de boa qualidade, assistência efetiva à saúde pública, mobilidade urbana, habitação, segurança alimentar. A violência nos centros urbanos é preocupante e responsável por índices de criminalidade inaceitáveis. Os pobres e, dentre estes, os negros, são as principais vítimas.

Naturalmente, esta realidade é também decorrência da crise econômica do sistema capitalista internacional a partir de 2008, que está pondo em risco a estabilidade de todo o Sistema, cuja perspectiva de solução ainda não está visível e cobra um preço elevado em países europeus, alguns à beira do colapso econômico, de graves consequências. Analistas comparam esta crise à de 1929.

Na realidade, a crise compromete as possibilidades potenciais de crescimento do país, em função das regras implícitas e explícitas da Globalização. Curiosamente, a crise do sistema capitalista vem sendo convenientemente atenuada pelos órgãos de comunicação. Lembremos que a crise de 1929 propiciou as condições para o surgimento de regimes autoritários na Europa, que culminariam no desencadeamento da II Guerra Mundial. Portanto, não se devem menosprezar os efeitos da crise de 2008, na economia e na política interna dos países em desenvolvimento.

A Economia e a disputa nos discursos sobre economia nacional

Há um quadro de desinformação da população sobre os aspectos mais gerais da economia Brasileira fruto do tipo de abordagem e informação divulgadas tanto pela grande imprensa quanto pelo governo federal. No que se refere à cobertura jornalística, além de uma linguagem com gráficos e tabelas complicando a compreensão, a informação é muitas vezes parcial e orientada por posições de ordem ideológica, em detrimento de mais clareza e objetividade. Um discurso alarmista da imprensa e análises pessimistas de comentaristas manifestam uma oposição quase sistemática do mundo financeiro e de setores do mundo empresarial ao governo federal, controvérsia ampliada com o horizonte das eleições em outubro de 2014. Os meios de comunicação em geral têm acentuado um tom especulativo sobre fatos e versões da atividade econômica, com propósitos tácitos ou explícitos de criar expectativas que não correspondem ao que seria adequado diante dos fundamentos da economia brasileira.

Observe-se, no entanto, que o governo não opera com a devida transparência ao divulgar dados da economia que são compostos de maneira diferente de como eram compostos anteriormente. O governo é também protagonista de peso na batalha da (des)informação econômica. Assim, alimenta-se o clima de desconfiança criado conjuntamente pela imprensa e pelos detentores do dinheiro, por um lado, e pelo próprio governo por outro lado.

Uma manchete recente é significativa dessa postura: "empresários retêm projetos de expansão e dificultam a recuperação da economia”. Apesar de uma política de desoneração, os detentores de capital não estão querendo mais investir na produção, mas aumentar seu lucro com rendimentos financeiros. A briga com a taxa Selic insere-se neste contexto. Segundo analista da Confederação Nacional do Comércio, a elevação da taxa Selic para dois dígitos é desnecessária e prejudicial, negando o excesso de consumo. Por outro lado, não há trégua nos discursos de alta inflação persistente e recessão.

A alta da taxa de juro (Selic) afeta o conjunto dos consumidores, sobretudo a nova classe média, pois, provoca um aumento das taxas dos cartões de crédito, dos cheques especiais, das compras a prestações que já eram abusivamente elevadas, verdadeiras taxas de usura. Com essa alta das taxas, está havendo também aumento dos endividados, seja no cartão de crédito, seja com carnês nas lojas. Outras manchetes: "PIB cresce 2,3%, mas incertezas persistem”. "Avanços da economia em 2013 surpreendem governo e analistas”. "Aumento de 0,7% no quarto trimestre supera projeções e livra o país da recessão”. Em contraponto, "Risco de recessão não impede alta de juros”. Analistas apontam que o Banco Central deve aumentar os juros básicos da economia a fim de reduzir expectativas de inflação. Outro analista, não apostador no mercado especulativo, afirma que a política monetária de juros altos do Banco Central não tem efeito sobre a inflação.

A ênfase em dados negativos foi e é uma característica da mídia nacional que recebeu parcialmente eco na mídia financeira internacional. "Brasil cria 1,1 milhão de empregos em 2013, pior resultado em dez anos”. Criar mais de um milhão de vagas, o que não é desprezível, com um crescimento de 2,3 % ao ano é melhor que o "pibinho” tão falado de 2012. "Arrecadação federal sobe, mas fica aquém da meta oficial”. Não menciona o montante de 77,8 bilhões de reais que o governo, por uma política de desoneração, deixou de arrecadar com incentivos para a produção industrial. No arrombo das contas da Previdência denunciado pela imprensa, não se deve esquecer que houve uma perda de 13,2 bilhões de reais para a contribuição previdenciária, logrando, apesar da desoneração tributária, uma receita 3 % acima da inflação.

Segundo outros analistas financeiros, o mercado peca por excesso de pessimismo veiculado pela grande imprensa em manchetes sugestivas: "alta inflação, disparada do dólar, déficit em conta corrente...” Entretanto, a economia brasileira teve um crescimento de 2,3 % no ano 2013, maior que o de 0,9 % do ano 2012. O investimento e a agricultura (agronegócio) tomaram o lugar do consumo como alavanca do Produto Interno Bruto (PIB). Mas, segundo projeções de "especialistas” do mercado presentes na mídia, este crescimento não deve se sustentar nos próximos semestres, invocando safra menor, juros maiores, inflação, mercado de trabalho mais fraco e real desvalorizado que vão fazer a economia estagnar. Para 2014, as expectativas seriam piores por causa do impacto negativo do aumento da taxa de juros.

Na perspectiva do aumento das taxas de juros nos Estados Unidos, há certo nervosismo do mercado financeiro mundial. Os países "emergentes” receberam fluxos de capital volátil para aproveitar as taxas de juros mais rentáveis nesses países. Mas com o reaquecimento da economia dos Estados Unidos, as taxas de juros vão subir atraindo de volta os capitais especulativos aplicados nos países "emergentes”, provocando uma alta do dólar e correlativamente uma desvalorização das outras moedas. O Brasil tem reservas sólidas em dólares que não estão rendendo quase nada, mas garante uma defesa do câmbio, o que não é o caso da Argentina, da Turquia e de outros.

Dos 376 bilhões de dólares em reservas internacionais que detém o Brasil, U$ 240 bilhões estão aplicados a menos de 2 % em títulos do tesouro americano. Esse dinheiro poderia dar melhor retorno se fosse aplicado via BNDES e outros bancos públicos, na expansão da economia brasileira. Com o aviso pelo BC, de um cronograma de leilões, da moeda americana, o dólar voltou à casa dos R$ 2,20.

Outro tema de inegável preferência da grande mídia trata do "agravamento sem precedentes” da situação externa e fiscal do país, expressa respectivamente pelo déficit das transações externas e da redução do "superávit primário” (reserva de dinheiro para pagar juros). O déficit externo é da ordem de 80 bilhões de dólares. Essa dependência em ‘serviços’, que é a renda do capital estrangeiro, não é nova. Esse déficit vinha sendo suprida pelas commodities do setor primário. Mas essa equação já não é mais viável por causa da inflexão dos preços das commodities. Os países chamados "emergentes” como Brasil, China e Índia têm que caminhar rumo a um modelo de crescimento mais focalizado no mercado interno. Mas essa mudança de rota não parece interessar aos formadores de opinião pública na mídia, nem ao próprio governo.

Agência de notificação Standard & Poor’s conhecida por seu apoio irrestrito via nota máxima de confiança ao Banco Lehman Brotthers, que faliu pouco tempo depois, ocasionando a maior crise do capitalismo desde 1929, baixou a nota do Brasil e ameaça rebaixar mais ainda, lançando dúvidas se o Brasil conseguirá cobrir as suas dívidas. Essa "captura” do Estado pelo capital financeiro perverte a democracia no Brasil. O recado de que a economia e o Estado estão em crise é assumido pela oposição com apoio da mídia, gerando um clima de desconfiança. Com sua forma de abordar a questão, a mídia insinua a possibilidade de inadimplência da dívida, estimulando assim uma subida dos juros, desnecessária e prejudicial.

O mercado acha que o governo federal intervém demais na economia, provocando inflação por sua política distributivista de renda, como, por exemplo, o aumento do salário mínimo acima da inflação. O ideário liberal acreditando na auto-regulação do mercado, prega a confiança nas forças cegas e na mão invisível do mercado para melhorar a situação dos mais pobres. É uma ideologia que pressupõe que todo crescimento econômico, favorecido pelo livre mercado, consegue por si mesmo produzir maior equidade e inclusão social no mundo. Esta crença, que nunca foi confirmada pelos fatos, exprime uma confiança vaga e ingênua na bondade daqueles que detêm o poder econômico e nos mecanismos sacralizados do sistema econômico reinante. Quem é o sujeito do mercado? Trata-se de 1% da população que abocanha 50% da riqueza nacional. Se, com a política do governo, a desigualdade entre salários se reduziu, a parte do rendimento do trabalho na renda nacional está diminuindo cada vez mais em favor do rendimento do capital que se apodera cada vez mais de uma parte maior da renda nacional.

Em contraposição à doutrina liberal que prega o "laissez-faire”, deixando o mercado fazer sua mágica, a meta do governo precisa ser uma distribuição de renda para fazer justiça social e crescer. A sensação de um clima inflacionário espalhado pela mídia visa difundir um temor da volta da inflação que é responsável por uma difusão da inflação. A aproximação das eleições acirra a disputa econômico-financeira entre governo e especuladores. A imprensa não está contribuindo para o debate político, substituindo a informação pela ideologia da crise permanente.

Violência

". Mas, enquanto não se eliminar a exclusão e a desigualdade dentro da sociedade e entre os vários povos será impossível desarraigar a violência. Acusam-se da violência os pobres e as populações mais pobres, mas, sem igualdade de oportunidades, as várias formas de agressão e de guerra encontrarão um terreno fértil que, mais cedo ou mais tarde, há de provocar a explosão. (...) Isto não acontece apenas porque a desigualdade social provoca a reação violenta de quantos são excluídos do sistema, mas porque o sistema social e econômico é injusto na sua raiz”. (EG n. 59)

Tem preocupado a todos a sensação de que estão aumentando as situações de violência no Brasil. Notícia publicada no dia 10 de abril afirma que, no ano de 2012, no Brasil foram registrados 10% dos homicídios no mundo1. Foram mais de 50 mil homicídios no território nacional. Os dados foram divulgados pela Organização das Nações Unidas. Outra pesquisa divulgada em março de 2014 colocava três cidades brasileiras, Maceió - Al, Fortaleza - CE e João Pessoa - PB, entre as dez mais violentas do mundo2. O levantamento levou em conta a taxa de homicídios por grupo de 100 mil habitantes. Foram levantados dados disponibilizados pelos governos em suas páginas na internet tendo considerado as cidades com mais de 300 mil habitantes. Estes dados, recentemente divulgados, reforçam uma preocupação corrente em relação ao aumento da violência no Brasil.

A reflexão sobre a situação de violência é algo complexo e exige cuidado na análise para não incorrermos em simplificações. Propomo-nos refletir rapidamente quatro aspectos que nos parecem pertinentes: a influência da cobertura jornalística na divulgação de situações de violência contribuindo para a sensação de que está aumentando; a estrutura social brasileira como geradora de violência; o aumento do tráfico de drogas e sua proximidade com situações de violência; a violência contra grupos específicos.

A facilidade das comunicações potencializada pela mídia e pelas redes sociais tem permitido que fatos, antes desapercebidos, fossem conhecidos em diferentes regiões do Brasil em curto espaço de tempo. Dois episódios ilustram esta constatação: a notícia do menino que foi preso ao poste por um grupo de ditos justiceiros e o caso da tentativa de furto de uma gargantilha no momento em que uma senhora estava sendo entrevistada sobre a onda de assaltos em determinada região do Rio de Janeiro.

Atualmente as notícias, inclusive sobre violência circulam em maior quantidade e com mais rapidez, o que leva parte da população a imaginar um aumento excessivo dos casos de violência. Não se nega que esta tem aumentado em diferentes regiões e modalidades. Mas cabe analisar o fato de que se têm produzido e circulado mais notícias sobre situações específicas de violência na grandes redes midiáticas, e isto feito com diferentes objetivos, para além do interesse de bem informar.

Como já foi analisado nesse texto, caberia também refletir a situação social do Brasil e a relação com o quadro de violência. Nos últimos anos tivemos uma tentativa de inserção social através de políticas governamentais compensatórias e incentivo ao consumo. Estas opções não compreendem a melhoria nas condições estruturais de vida no Brasil. Essa violência estrutural toca em muitos aspectos da realidade: desigualdade social, maioridade penal, extermínio de jovens, mercantilização da vida, da sociedade, da cultura. Ela tem influência direta em todo o processo de sobrevivência da população.

Se na base social não aconteceram transformações, convém recordar que a desigualdade social de fundo histórico permanece com um fator gerador de violência3. A pesquisa sobre as cidades onde ocorreram mais assassinatos no Brasil revela que a maior parte ocorreu em periferias de extrema miséria e de uma presença nula ou muito limitada do Estado por meio de políticas sociais. Nestes espaços não existem iniciativas consistentes voltadas à melhoria das condições reais de vida4. Então ocupa lugar o crime organizado com suas leis e seu modo próprio de demarcar seu espaço social.

Existe outro elemento a ser analisado: o aumento das populações em situação de dependência química e consequentemente o aumento do tráfico de drogas, considerados em pesquisas como grande motivador dos crimes contra a vida e com grande proximidade com o crime organizado. De acordo com o levantamento da Confederação Nacional de Municípios - CNM, 93,90% das cidades brasileiras têm consumo drogas. A pesquisa5 revela ainda que, em 58,50% dos municípios, o uso e tráfico de drogas influenciam na dinâmica da segurança pública e, certamente, na dinâmica econômica e social. No caso do uso de drogas ou outras substâncias geradoras de dependência, a pessoa acaba por perder as possibilidades de convívio social dentro de um relativo equilíbrio. A situação de dependência é mais forte do que qualquer vínculo ou opção por um vivencia cidadã.

Correlato a isto está a "economia” informal/criminosa que o tráfico de drogas movimenta, segunda maior fonte de renda ilegal no mundo. Esta atividade está longe de qualquer controle estatal e tem seu código de leis próprio, muitas vezes sustentado por ações de violência e corrupção dos entes do Estado. Os crimes ligados ao tráfico de drogas têm aumentado na medida em que aumentam os consumidores.

Outra dimensão importante a ser analisado no caso do aumento da violência diz respeito à pertença social dos vitimados. Tem aumentado o número de jovens negros e do sexo masculino mortos/assassinados. A maioria dos homicídios que ocorrem no Brasil atingiu pessoas jovens, entre 15 e 29 anos, cerca de 50% do total de mortos. No percentual da população jovem que perdeu a vida 75% eram negros. Chama a atenção o fato de que à medida que aumenta o número de jovens negros assassinados diminui o número de jovens brancos. Os homicídios foram a causa da morte de 6.685 jovens brancos e de 18.595 jovens negros na faixa de 15 a 29 anos6. Aqui é importante que lembremos os tantos casos de violência da polícia contra os jovens. A população pobre em geral, incluindo os jovens, tem cada vez mais resistência às forças policiais, especialmente as polícias militares pelo histórico de agressões que tem sofrido. O caso de Cláudia, arrastada pela viatura da polícia militar do Rio de Janeiro, dá um indicativa de como é esta relação. Sobre a violência no campo, a CPT todos os anos publica o caderno informativo sobre a violência no campo. Em 2013, ocorreram 34 assassinatos. Do total de vítimas fatais, 61,3% pertencem a grupos/classes sociais/etnias caracterizados como Populações Tradicionais. Estas correspondem a 58,8% do total das categorias sociais que sofreram ações violentas7. O número de mulheres vitimadas pelos conflitos no campo tem aumentado. Nos últimos 10 anos, 20 mulheres foram assassinadas, 55 sofreram tentativa de assassinato. Mas a violência contra a mulher tem aumentando não só no campo. É alarmante o número de mulheres mortas de forma violenta, alcançando neste momento histórico o mais alto índice. Segundo o Ipea, estima-se que ocorreram, em média, 5.664 mortes de mulheres por causas violentas a cada ano, 472 a cada mês, 15,52 a cada dia, ou uma a cada hora e meia. São vítimas de agressões, principalmente por causa de conflitos de gênero.

Desafios que emergem nesse contexto:

a) Evidenciar para toda a sociedade brasileira as raízes da violência centradas na desigualdade social e econômica e na estrutura autoritária do estado brasileiro, apontando caminhos de superação desses aspectos com políticas públicas efetivas.

b) Fortalecer iniciativas como a do Conselho Permanente da CNBB que em março se propôs a aprofundar a compreensão do problema da violência, provocando uma campanha pela paz construída em diálogo com diferentes entidades sociais e religiosas. Sabe-se que a proposta precisa chegar à sociedade suscitando o compromisso com a construção da paz.

c) Garantir que governos a efetuem uma substancial alteração do modo de formação e atuação das forças policiais e no modo de funcionamento do sistema prisional para que primem pelo respeito aos direitos humanos;

Indígenas, quilombolas e populações tradicionais: disputa de uma concepção de país

"com a exclusão fere-se na própria raiz a pertença à sociedade onde se vive, pois quem vive nas favelas, na periferia ou sem poder já não está nela, mas fora. Os excluídos não são "explorados”, mas resíduos, "sobras” (EG n. 53).

Os povos indígenas, quilombolas e povos tradicionais, juntamente com seus direitos territoriais e culturais vêm sofrendo sérias ameaças por parte do Estado brasileiro e de suas classes dominantes. O Congresso Constituinte (1986-1988), por ter se constituído num desaguadouro das lutas populares que colocaram abaixo a ditadura civil-militar, foi sensível ao reconhecimento, pela nossa Constituição Federal, dos direitos dos povos indígenas, das comunidades quilombolas, de outros segmentos minoritários e da necessidade da proteção ambiental no país. As Disposições Constitucionais Transitórias chegaram a estabelecer o período de cinco anos para que todas as terras indígenas fossem demarcadas.

Durante um longo período, particularmente nos anos 1980 e 1990, tivemos sucessivas crises econômicas no Brasil e no mundo e a comunidade internacional viveu o fim da Guerra Fria e a abertura de um novo momento histórico, de valorização da diversidade cultural e do patrimônio ambiental de cada país. Os setores progressistas também deixaram de investir apenas nas lutas operárias, para reconhecerem o valor das lutas territoriais, culturais, ambientais e seus protagonistas populares.

Este conjunto de fatores propiciou que o Estado brasileiro, apoiado pela cooperação internacional, realizasse um amplo processo de demarcação das terras indígenas na região amazônica, com a participação ativa das próprias comunidades e de suas organizações. A falta de interesse por parte das grandes empresas naqueles territórios distantes dos centros econômicos permitiu que este processo fosse realizado de maneira relativamente tranquila. Além das terras indígenas foi possível avançar também na definição de áreas destinadas à proteção ambiental (parques nacionais, reservas biológicas) e iniciar o reconhecimento dos territórios quilombolas.

Durante a última década este cenário começou a mudar: a ênfase na retomada do crescimento econômico; a busca de exploração intensa dos territórios do interior do país; o surgimento de uma classe dominante no campo que associa o velho latifúndio ao agronegócio e aos interesses do capital financeiro; a mudança político-partidária no Congresso Nacional, que dá mais peso a estes novos setores oligárquicos; a simpatia da mídia, que reflete estes novos interesses, tudo isso fez com que a disputa territorial passasse a figurar no centro da nossa agenda política.

Estabeleceu-se uma forte contradição: enquanto os direitos territoriais e culturais dos povos indígenas, das comunidades quilombolas e das demais populações tradicionais eram cada vez mais reconhecidos no plano internacional e por setores da sociedade nacional, os setores hegemônicos na economia e na política nacionais passaram a desencadear uma ofensiva extremamente agressiva no sentido de desconstruir e anular estes mesmos direitos territoriais e culturais. A mesma ofensiva ocorre com o objetivo de desconstruir os avanços ocorridos na preservação dos nossos diferentes biomas, das nossas florestas e dos nossos rios.

Enquanto a comunidade internacional se preocupa seriamente com a preservação ambiental como estratégia para reverter as mudanças climáticas, inclusive para proteger o planeta e a própria espécie humana, os setores hegemônicos hoje, na economia e na política nacionais, pretendem fazer tabula rasa dos direitos territoriais dos povos indígenas, quilombolas e populações tradicionais, principais responsáveis pela preservação de nosso vasto patrimônio ambiental.

Dentro deste contexto se compreende a pressa com que os setores econômicos e políticos se mobilizam para aprovar a PEC 215, que retira o poder de demarcação das terras indígenas do Poder Executivo e o transfere para o Poder Legislativo, além de permitir a revisão e anulação de todas as demarcações já feitas e a extinção de todos os territórios quilombolas e áreas de proteção ambiental.

As "audiências públicas” que estão sendo realizadas no interior do país para "debater a PEC 215” mais parecem um teatro para se divulgar um discurso pré-constitucional, onde a visão integracionista, que se acreditava superada na nossa história, volta com toda a força. Segundo esta visão, não é mais necessário demarcar terras indígenas, pois o desejável é a "integração definitiva dos indígenas na sociedade nacional”. Além da PEC 215 existem outras proposições legislativas que também pretendem restringir ou anular os direitos dos povos indígenas, além de ações no Supremo Tribunal Federal para extinguir os direitos dos povos indígenas e das comunidades quilombolas.

Paralelamente a este ataque sistemático por parte da nova oligarquia agrária-empresarial-financeira do país, percebe-se que o Estado não está aparelhado de forma adequada para demarcar e proteger os territórios dos povos indígenas, comunidades quilombolas e populações tradicionais, nem para defender as áreas de proteção ambiental. Faltam recursos humanos, materiais e financeiros, além de estruturas governamentais eficientes, para que estes territórios sejam protegidos de maneira adequada, como manda a nossa Constituição Federal.

O embate que testemunhamos cotidianamente na mídia, nas redes sociais, nas ruas, no Congresso Nacional, no Poder Judiciário, no interior do Governo e nos territórios do interior do país é um embate de dimensões históricas. Neste embate não se disputa apenas a demarcação de uma ou outra terra indígena; a titulação de uma ou outra comunidade quilombola; o reconhecimento de uma ou outra população tradicional; a proteção de uma ou outra reserva biológica.

Neste embate se disputa uma concepção de país: uma concepção baseada nos direitos territoriais, culturais e ambientais do conjunto do nosso povo, ou uma concepção baseada nos interesses imediatos das nossas elites econômicas.

Essa realidade nos coloca ao menos cinco grandes desafios:

1. A sociedade brasileira precisa conhecer a história e a situação atual dos povos indígenas, das comunidades quilombolas e das populações tradicionais, também conhecer a história e a situação atual das áreas de proteção ambiental.

2. A sociedade brasileira tem o direito de se pronunciar com relação às ameaças que todos estes povos e territórios sofrem por parte de segmentos da própria sociedade e do Estado, pois é uma possibilidade de destino do nosso país que se encontra hoje seriamente ameaçada.

3. A sociedade brasileira está desafiada a criar novos canais de participação e redes de solidariedade que garantam os direitos dos povos indígenas, comunidades quilombolas e populações tradicionais, assim como os direitos do conjunto da população em ter as áreas ambientais públicas protegidas.

4. O Estado brasileiro, através dos três poderes da República, é desafiado a cumprir com o mandato constitucional que manda proteger os povos indígenas, as comunidades quilombolas, os segmentos mais frágeis da população e proteger o patrimônio ambiental do país.

5. A aprovação da PEC 215 pelo Congresso Nacional é uma ameaça real aos direitos constitucionais dos povos indígenas, de todos os pobres do campo e aos direitos da natureza, além de significar uma anulação de parte significativa da contribuição da CNBB, através de Dom Luciano Mendes de Almeida, ao processo constituinte e à Constituição Federal aprovada em 1988. O que se pode fazer para que este grave retrocesso institucional não ocorra no país?

Outras questões transversais...

"Enquanto não forem radicalmente solucionados os problemas dos pobres, renunciando à autonomia absoluta dos mercados e da especulação financeira e atacando as causas estruturais da desigualdade social, não se resolverão os problemas do mundo e, em definitivo, problema algum. A desigualdade é a raiz dos males sociais" (EG n. 202).

Há uma variedade de temas que também mereceriam uma análise mais apurada para uma adequada compreensão da conjuntura nacional e que permitiriam vislumbrar estratégias de intervenção na perspectiva de lutar contra os sinais de morte e produzir sinais de vida. Dentre estes temas poderíamos destacar:

- O legado a ação Penal 470 para o país, pois foi o julgamento mais falado, ouvido transmitido de nossa história, mas que parece ter influenciado pouco no que se refere a mudança nas práticas da política institucional pelo que pudemos assistir no curso das eleições municipais de 2012 e agora na véspera das eleições de 2014;

- Os desdobramentos, em termos de alteração, no modo de organização e manifestação social decorrentes das manifestações populares que ocorrerm a partir de Junho de 2013 e, nessa análise, os alcances e limites dessas manifestações. Essa análise se justifica, pois estamos a pouco mais de mês da Copa do Mundo de Futebol e há expectativas sobre a intensidade das manifestações previstas para esse período, bem como as formas como os diferentes governos atuaram como resposta a elas.

- Os gastos com a dívida pública que continuam sendo um dos maiores gargalos que impedem um efetivo investimento em educação, saúde e outras políticas sociais que garantiriam melhor qualidade de vida para a população, sobretudo, para os mais pobres;

- A necessária retomada e intensificação da reforma agrária abandonada nos últimos anos e a também urgente reforma urbana que garantiria melhor equidade na distribuição dos espaços sem expulsar os mais pobres para áreas cada vez mais distantes dos centros e uma reorganização da mobilidade urbana nas cidades;

- A análise dos resultados das políticas de transferência de renda como o Bolsa Família e de moradia como o Minha Casa, Minha vida para verificar se sua efetividade garante alguma emancipação social ou como tem sido visto em alguns lugares que a conquista da moradia se torna ao mesmo tempo em problema pois não é acompanhada da efetivação de outros direitos sociais como a mobilidade urbana, saúde, educação, lazer e outros;

- O modelo de desenvolvimento econômico que prevê investimentos em megaprojetos de infraestrutura como hidroelétricas, mineração e grandes eventos que impactam a vida de milhões de pessoas e o meio ambiente comprometendo a qualidade de vida atual e futura no país;

- A matriz energética, fortemente centrada em hidroelétricas, termoelétricas e no petróleo. Há urgência de investimentos públicos e privados em fontes não poluentes e que sejam renováveis como a eólica e, sobretudo a energia solar ao mesmo tempo que se diminua e evite fontes como a energia nuclear e termoelétricas;

- A situação do oligopólio nos meios de comunicação social, que são concessões públicas e que faz com que os principais veículos de informação da população atendam mais os interesses de uma elite econômica do que as necessidades da sociedade em geral. Há urgência de uma legislação que garanta uma democratização na produção e transmissão de conteúdos como já fizeram países desenvolvidos e vizinhos do Brasil na América Latina. As mais de 600 propostas aprovadas pela 1ª Conferência de Comunicação, no final de 2010, sequer têm sido consideradas pelo governo, frustrando sobremaneira os movimentos sociais mais diretamente ligados à comunicação.

- Diversas políticas públicas, que contemplam demandas e propostas de setores populares vulneráveis, foram elaboradas, definidas e aprovadas pelos Poderes Executivo e Legislativo, em processos participativos como Conselhos e Conferências Nacionais ou em debates e votações no Congresso Nacional. Porém, o Estado brasileiro não regulamenta, não define recursos orçamentários suficientes nem toma as medidas necessárias, do ponto de vista organizativo e da gestão governamental, para que tais políticas públicas possam ser efetivamente implementadas. Esta realidade, além de manter excluídos da cidadania os setores populares vulneráveis, questiona os avanços e mesmo a validade dos processos de representação e de participação popular atualmente existentes.

*Contribuíram para esta análise: Pe. Bernard Lestienne SJ, Pe. Thierry Linard SJ, Pe. Ari dos Reis, Pe. Ernanne Pinheiro, Daniel Seidel, Pe. Geraldo Martins, Gilberto Sousa e Pedro Gontijo.

Notas:

1 Cf. Relatório Global sobre Homicídios 2013. Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (Unodc).

2 Cf. https://oglobo.globo.com/pais/brasil. Levantamento do Escritório sobre Drogas e Crime das Nações Unidas.

3 Campanha da Fraternidade de 1983: fraternidade sim, violência não. Campanha da Fraternidade de 2009: fraternidade e segurança pública, CNBB.

4 Cf. Campanha da Fraternidade 1983, fraternidade sim violência não, CNBB, p. 21.

5 Pesquisa publicada em 2011 pelo "Observatório do Crack”, lançado em abril de 2011 pela Confederação Nacional dos Municípios.

6 O Instituto Sangari tem publicado anualmente o mapa da violência no Brasil com um destaque especial a violência contra as Juventudes.

7 Cf. CPT. Caderno de conflitos no campo.

 
 
 
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